segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

(Livro) Garota Exemplar!

**Texto com Spoilers**

Eu poderia dizer que o fato de ser produtora editorial faz com que eu goste de ganhar livros, mas a verdade é que meus olhinhos sempre brilharam por esse tipo de presente (o que pode explicar a escolha da carreira, no final das contas) e quem me conhece sabe. E quem sabe me dá de livros (e pinguins, outra paixão) e me deixa feliz como criança que ganhou brinquedo novo.

E uma dessas pessoas fofas, amiga e também filha da ECO/UFRJ, me presenteou neste aniversário com Garota Exemplar e comentou que “azamigas feministas estão gostando muito”. Eu já tinha ouvido falar deste livro quando do lançamento do filme inspirado nele, mas admito que na época não me chamou atenção e deixei para lá.

O livro ficou uns dias na minha estante porque eu estava lendo outro e sou uma mocinha fiel (um livro por vez!), mas quando terminei o anterior resolvi apostar que Garota Exemplar seria uma boa companhia para os dias de folga que eu teria na semana do Natal e coloquei na mala. E que livro! Estou simplesmente apaixonada pela Gillian Flynn (a autora).

A história realmente gira em torno do desaparecimento de Amy e da suspeita que começa a pairar sobre Nick, seu marido. Mas é MUITO mais que isso. A autora intercala os capítulos entre relatos de Nick no presente, já durante as buscas pela esposa, e trechos de diários de Amy ao longo dos sete anos de relacionamento e cria um clima de “ele disse, ela disse” que envolve bastante o leitor. “Escolha um lado”, parece dizer a narrativa.

O que eu mais gostei, no entanto, é que a autora nos manipula com perfeição através da protagonista. O primeiro terço do livro (não em número de páginas, mas na divisão da obra) é todo feito para que a gente acredite que Amy é uma mulher gente boa que está tendo problemas com o marido egoísta. A gente fica querendo abraçar ela, sabe? E dizer coisas como “larga esse cara, querida”. O próprio Nick em sua parte como narrador sabe que não tem sido um companheiro muito legal, apesar de ter bastantes queixas a respeito do comportamento da esposa.

E a gente fica nessa angústia, achando que algo aconteceu com Amy (apesar da sensação de ser bem improvável que tenha sido culpa do Nick) e esperando a reviravolta. E ela vem. E vem com tudo. Na verdade a história toda do desaparecimento foi armada pela própria Amy, durante um ano inteiro, a partir do momento em que ela descobriu que estava sendo traída. O plano foi elaborado como forma de punição para Nick. Aí a gente vê como ela é ardilosa e malvada e como já aprontou antes e as coisas sempre deram certo.

A partir desse momento meu maior medo era que o livro caísse no lugar comum de tentar fazer com que os leitores passassem a torcer contra a protagonista afinal ela é uma menina má. Mas isso não acontece porque a essa altura Amy já nos envolveu. E aí veio meu segundo receio, que era dela ser punida ou encontrar algum tipo de redenção a partir do arrependimento/sofrimento/amor. E isso também não veio. E eu amei o livro. Adorei a coragem da autora de escrever uma personagem feminina completamente manipuladora e anti-heroína que não precisa “pagar” por isso no final das contas. Amy é linda, louca, malvada. E se dá bem no final. Como não amar?

A gente até está acostumado com anti-heróis na ficção, mas a maioria é composta personagens homens que fazem tudo errado e que mesmo assim são tidos como charmosos e interessantes e que podem muitas vezes se dar bem sem culpa. Às personagens mulheres que ousam desafiar o papel de boas moças costuma ser dado um desfecho que mostre que não é uma boa ideia ir contra o sistema, a moral e os bons costumes. Por isso eu gostei tanto desse livro, por ser diferente. E entendi a frase da minha amiga, sobre ele estar fazendo sucesso entre as feministas.

O grande mérito de Garota Exemplar, em minha opinião, é se livrar das amarras morais. Isso é ficção, gentes! Não é preciso pautar toda e qualquer história com os parâmetros éticos e morais do mundo real porque isso limita a arte. Nem tudo precisa terminar com uma lição de que só o bem compensa. A verdade é que Amy é uma personagem feminina que tem tudo para ser desprezível, mas que é cativante. E acredito que nos conquista justamente por essa liberdade de ser quem é. Não almejo ser Amy nem conviver com pessoas assim porque obviamente ela é completamente criminosa e cruel, mas quero que ela exista na ficção. Quero que as mulheres tenham esse protagonismo de serem retratadas das mais diversas formas. Que possam ser inclusive más. E sem precisar de desculpas.  

1 comentário:

  1. Muito bom o post do livro. Realmente é preciso dar uma nova perspectiva para o papel das mulheres e não seria mesmo possível falar disso sem spoiler no texto. Parabéns pela postagem.

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