**Texto com Spoilers**
Eu poderia
dizer que o fato de ser produtora editorial faz com que eu goste de ganhar
livros, mas a verdade é que meus olhinhos sempre brilharam por esse tipo de
presente (o que pode explicar a escolha da carreira, no final das contas) e
quem me conhece sabe. E quem sabe me dá de livros (e pinguins, outra paixão) e
me deixa feliz como criança que ganhou brinquedo novo.
E uma dessas
pessoas fofas, amiga e também filha da ECO/UFRJ, me presenteou neste aniversário
com Garota Exemplar e comentou que “azamigas feministas estão gostando muito”.
Eu já tinha ouvido falar deste livro quando do lançamento do filme inspirado
nele, mas admito que na época não me chamou atenção e deixei para lá.
O livro ficou
uns dias na minha estante porque eu estava lendo outro e sou uma mocinha fiel
(um livro por vez!), mas quando terminei o anterior resolvi apostar que Garota
Exemplar seria uma boa companhia para os dias de folga que eu teria na semana
do Natal e coloquei na mala. E que livro! Estou simplesmente apaixonada pela Gillian
Flynn (a autora).
A história
realmente gira em torno do desaparecimento de Amy e da suspeita que começa a
pairar sobre Nick, seu marido. Mas é MUITO mais que isso. A autora intercala os
capítulos entre relatos de Nick no presente, já durante as buscas pela esposa,
e trechos de diários de Amy ao longo dos sete anos de relacionamento e cria um
clima de “ele disse, ela disse” que envolve bastante o leitor. “Escolha um lado”,
parece dizer a narrativa.
O que eu mais gostei, no entanto, é que a autora nos manipula
com perfeição através da protagonista. O primeiro terço do livro (não em número
de páginas, mas na divisão da obra) é todo feito para que a gente acredite que
Amy é uma mulher gente boa que está tendo problemas com o marido egoísta. A
gente fica querendo abraçar ela, sabe? E dizer coisas como “larga esse cara, querida”.
O próprio Nick em sua parte como narrador sabe que não tem sido um companheiro
muito legal, apesar de ter bastantes queixas a respeito do comportamento da
esposa.
E a gente fica nessa angústia, achando que algo aconteceu com
Amy (apesar da sensação de ser bem improvável que tenha sido culpa do Nick) e
esperando a reviravolta. E ela vem. E vem com tudo. Na verdade a história toda
do desaparecimento foi armada pela própria Amy, durante um ano inteiro, a
partir do momento em que ela descobriu que estava sendo traída. O plano foi
elaborado como forma de punição para Nick. Aí a gente vê como ela é ardilosa e malvada
e como já aprontou antes e as coisas sempre deram certo.
A partir desse momento meu maior medo era que o livro caísse
no lugar comum de tentar fazer com que os leitores passassem a torcer contra a
protagonista afinal ela é uma menina má. Mas isso não acontece porque a essa
altura Amy já nos envolveu. E aí veio meu segundo receio, que era dela ser
punida ou encontrar algum tipo de redenção a partir do arrependimento/sofrimento/amor.
E isso também não veio. E eu amei o livro. Adorei a coragem da autora de
escrever uma personagem feminina completamente manipuladora e anti-heroína que
não precisa “pagar” por isso no final das contas. Amy é linda, louca, malvada.
E se dá bem no final. Como não amar?
A gente até está acostumado com anti-heróis na ficção, mas a
maioria é composta personagens homens que fazem tudo errado e que mesmo assim
são tidos como charmosos e interessantes e que podem muitas vezes se dar bem
sem culpa. Às personagens mulheres que ousam desafiar o papel de boas moças
costuma ser dado um desfecho que mostre que não é uma boa ideia ir contra o
sistema, a moral e os bons costumes. Por isso eu gostei tanto desse livro, por
ser diferente. E entendi a frase da minha amiga, sobre ele estar fazendo
sucesso entre as feministas.
O grande mérito de Garota Exemplar, em minha opinião, é se
livrar das amarras morais. Isso é ficção, gentes! Não é preciso pautar toda e
qualquer história com os parâmetros éticos e morais do mundo real porque isso limita
a arte. Nem tudo precisa terminar com uma lição de que só o bem compensa. A
verdade é que Amy é uma personagem feminina que tem tudo para ser desprezível,
mas que é cativante. E acredito que nos conquista justamente por essa liberdade
de ser quem é. Não almejo ser Amy nem conviver com pessoas assim porque
obviamente ela é completamente criminosa e cruel, mas quero que ela exista na
ficção. Quero que as mulheres tenham esse protagonismo de serem retratadas das
mais diversas formas. Que possam ser inclusive más. E sem precisar de
desculpas.
Muito bom o post do livro. Realmente é preciso dar uma nova perspectiva para o papel das mulheres e não seria mesmo possível falar disso sem spoiler no texto. Parabéns pela postagem.
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